ROBÔ DA VIDA

Angela Moura


Vida HP, semimoderna, apesar do laser e das cores, estava mesmo sem sorte.

Robô Uno-286, seu quinto, rabugento e robótico marido, ultimamente, andava devagar com a Vida. Sem mais nem menos, começou a apresentar danos escleróticos em seus K-Ram de memória.
Será que estava ficando enferrujado?

 

Vida precisava fazer algo que o tocasse fundo. Não sabia o quê. Talvez uma pedra, um prego, algum chip ou uma palavra doce... Decidiu provar a última.
Olhando Robô apático, lembrava aquela postura tão cheia de aço, agora, a parecer vazia... Ao contrário da barriga que, de tão prosaica, parecia carregar trigêmeos de problemas.
O parto ia ser difícil?!


Enquanto isso, Robô, num canto da sala, falava baixinho com seu Espelho:
- A vida passa depressa. E Vida já não é aquela. Acho que tem um parafuso solto. Fala pelos cotovelos, dá choque toda hora... Reclama que sou um, que acordo uma vez por semana, que só dou um beijo, um sorriso, um...
Imagine, Espelho, que ela implica o tempo todo com o número um...

Robô se perdia em pensamentos e resmungos.
- É pena! O romance deve ter se perdido em algum lugar. Não sei se volta... Aí sim, feliz da vida, eu podia atacar de paixão, cantar um hino, hastear a bandeira... Gritar, gritar que nem louco... Você ia se quebrar de inveja.

E Robô, de mal com a vida, sonhando com outra, continuava a maldizer a própria:
- A vida é o maior quebra-cabeça. Um dia vai acontecer aquela peça principal que está faltando no meu teclado... Cheia de vida pra ninguém botar defeito... Com os cabelos descendo sobre o corpo... Que corpo! Vou até perder a barriga para viver um grande amor... Quero é cair na vida, naquela que pedi a Deus.

Exaltado, danado da vida, completou:
- A velha Vida nunca está satisfeita. Diz que a empurro com a barriga. Não sei por que ela reclama, afinal, meu amigo, dou sempre o um que ela precisa. O resto é trabalho, trabalho e... problemas! Sobrevivência, cara!
O que alguém pode querer mais?
Quem ela pensa que sou:
um Homem ou uma Máquina?

Já tinham se passado seis meses que não ouvia falar de Vida.
De máquina em máquina, Robô passava dias e noites a experimentar todas. Mas percebia sempre alguma coisa errada.

Naquela tarde, encontrou Robô Up - antigo colega de série, que não cabia em si de tanto sorriso e, com o maior deles, foi logo dizendo:
- Sou um Robô de sorte. Encontrei a máquina que sonhei a vida toda! ...Tive que disputá-la com mais de dez, mas, valeu a pena!
Acredita que o otário do último dono dela a deixou apenas por falta de óleo?
Agora, ela está novinha em folha!
É linda! É a Vida!



Robô Uno, mais que apressado, nem se despediu do amigo. De repente, passou a correr por três atrás de sua Vida. Quem sabe, ainda, conseguiria chegar a tempo?!...


Do livro ROBÔ DA VIDA e outros Contos.
Copyright© 1993 by Angela Moura
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(Repasse com os devidos créditos)

 






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Imagens:
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