O Orgulho
Angela Moura



Orgulho nasceu maior que a média, e,
sem sombra de dúvida, foi grande demais,
em qualquer ocasião.

Desde pequeno, seu espírito de porco e
competição o empurrava para os jogos,
disputas ou qualquer batalha
que se apresentasse no caminho.
O importante era ganhar.

Por seu tamanho, julgava-se o maior,
em todos os sentidos. E Orgulho, irmão
de Vaidade, fazia questão de mostrar
isso... Velho hábito de família.

Passava a vida provando ser genial:
um cara boa-pinta, decidido, competente,
espirituoso, simpático, inteligente,
audacioso, enfim, um cara fora-de-série.

Modéstia nunca fez parte do seu dicionário
e, desde sempre, aqueles que o cercavam
estavam cientes de suas muitas vitórias.
Fracassos não faziam seu gênero.
Orgulho só tinha um problema:
crescia sem parar.

Entendia de tudo.
Impressionava à primeira vista e à primeira
mordida, o que levava grande parte de seus
amigos a sofrer da dor de cotovelo e a estar,
de tempos em tempos, com o braço dolorido.
Mas, apesar dessa queixa, admiravam e
respeitavam Orgulho, como um herói.

Um belo dia, Orgulho deu uma vacilada.
Foi naquele campeonato surrealista. A cabeça
chegou na hora certa, mas, o corpo não,
ou vice-versa.
Resultado: último lugar.

Absolutamente abalado e acabrunhado,
contraiu a vergonha apática - grave doença
dos falsos campeões.
Ficou de cama pelo menos uns de seus
melhores seis meses.

Além dos transtornos causados pela doença,
Orgulho acumulava os que não tinha coragem
de contar para ninguém, bloqueado
por seu nome.

Apesar de se encontrar no cume do cúmulo
da carência, procurava não demonstrar suas
necessidades e temores, fazendo o jogo do
esconde-esconde - seu brinquedo favorito.

Enquanto isso, a desilusão de sua primeira
derrota crescia dentro dele, não conseguindo ser
digerida por sua gulosa busca de sucessos.

Nessa quarentena forçada,
Orgulho descobriu que não era tão forte
como se imaginou em todas as suas vidas.
Ao sair à rua, precisava recarregar a bateria
para aumentar artificialmente seu brilho.
Mas, constantemente, voltava de
farol baixo para casa.

Já não era grande.
Os amigos começaram a perceber que
havia algo errado e tentavam oferecer ajuda.
Já Orgulho, afundado em seu poço, não podia
abrir a guarda, mostrando sua baixa auto-estima,
autopiedade e melancolia. Nem sua urgência
de um ombro amigo.

Ao se olhar no espelho - seu imaginário
conselheiro, percebia que tinha fechado os olhos
para suas necessidades, para seu lado criança
carente de colo. Aprendeu cedo demais que
não podia chorar nem demonstrar fraqueza.
Falar manso era coisa de mulher.

O peso de Orgulho, acumulado em anos e anos,
pesava toneladas em seus ombros e na balança de
seu equilibrado, ensaiado e costumeiro modo de ser.
De tão desmedido, não conseguia se ver no antigo
espelho e já se saía até pela urina.
Com esse fato diurético da história, Orgulho
começou a perder peso e tamanho.
Na mesma proporção em que encolhia,
entendeu que ninguém pode
vencer o tempo todo.
É o jogo da VIDA.

Nesse momento, depois de quase
ser vencido naquele ameaçador impasse
- o do combate consigo mesmo,
com todas as letras,
trocou de nome.


 

Do livro O ROBÔ DA VIDA e outros Contos.
 Copyright© 1993 by Angela Moura.

(Repasse com os devidos créditos)
 






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