O Náufrago

Angela Moura


Devagar, com seus 28 anos de
praia, não sabia nadar.
Num belo dia de sol, resolveu dar
um passeio em seu bote inflável.
Cantando, Devagar curtia as marolas
e as garotas que nadavam à sua volta.
Mas, a alegria não durou muito.
Percebeu que o bote esvaziava aos
poucos e, na mesma hora, começou
a suar e rezar.



Agarrado à borracha quase vazia,
nem ousava se mexer. Rezava cada
vez mais alto, pedindo a Deus que
o salvasse dessa.
E achou que Ele tinha ouvido
sua prece, quando avistou uma
pequena bóia.
Logo desistiu. Era uma bóia de
criança e preferia morrer afogado
a perder sua dignidade.
- Imagine chegar na areia com aquela
boinha colorida, pensava Devagar.
Um vexame! O que os outros
iriam dizer?
E decidiu: ia morrer mas não
perderia a pose.

Continuou rezando.

Do nada, apareceu um surfista.
Devagar não agüentou mais:
agarrou-se ao pescoço do atleta com
tanta sofreguidão, que os dois
foram a pique.
O rapaz o olhou assustado e gritou:
- Sai pra lá, seu louco! Agora sei o
que é o abraço do afogado... E
fugiu apressado no túnel da
primeira onda.

Devagar, horrorizado, com os dentes
chacoalhando de medo, não se movia,
só conseguia boiar e continuava
rezando, agora, aos berros. Até
que o tempo fechou.
- É, Deus esqueceu mesmo de mim,
não vou conseguir sobreviver,
chorava Devagar. Estou perdido!

O céu de tão cinza parecia noite...
O mar cada vez mais agitado... Foi
quando apareceu aquela onda. Nunca
em sua vida tinha visto outra igual.
Era uma onda gigantesca vindo
em sua direção.
A onda o alcançou em cheio.
Devagar, quase desacordado,
conseguia ouvir muito longe os trovões
que ressoavam por toda parte.
Era o fim!

Até que se fez ouvir aquela voz
sobre-humana no exato momento em
que a onda furiosa o arremessou
na areia.
- Vai ser devagar assim no
Inferno... Pelo menos bate os
pés, desgraçado!



Do livro O ROBÔ DA VIDA e outros Contos
Copyright© 1993 by Angela Moura



(Repasse com os devidos créditos)

 






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